terça-feira, 22 de março de 2011

(DIVISÃO) 24/10/2009

terça-feira, 22 de março de 2011
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As flores por sobre a mesa
E os longos dias de inverno
Possuem a mesma tristeza
De um frio longo e eterno.
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Numa cadência ou ritmo

Eu vejo as flores - Morrer
Por sobre o eixo marítimo
Cansado de mim... e chover.
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E por sobre a mesa só resta
um pouco, creio, de mim:
Olhar que vê pela fresta
Para não ver nada enfim.
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F.T.O

(PRECE ANTIGA) 25/10/2009

I
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Eu bebo o sangue da uva
Eu bebo o ceu de carmim
Pois o que sou coadjuva
Com o que não tenho em mim
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Eu sinto em mim o intervalo
Alguém correndo na brisa
Em uma canção de orvalho
Pela manhã imprecisa.
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Não posso ouvir a cantiga
Que tem o sopro do vento
Em uma prece antiga
Que vive em cada momento.
.
II
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O teu silêncio tem o cheiro
Que tem o ar do amanhecer
Que a gente sente por inteiro
Porém, jamais, o pode ver.
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Pois tem segredos combinados
intercalados numa voz
De quando foram segredados
Porque falavam sobre nós.
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Eu posso crer que justifique
Porém não sei se saberei
Ver a fragrância que ainda fique
Em tudo aquilo que falei.
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Oliveira.F.T

26/10/2009 (EM CADA DIA QUE AMANHECE)

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E a minha noite se fez dia
de uma noite anterior
Por uma estranha alegoria:
A cor do sol em uma flor
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Não encontrei a minha estrada
Na brisa leve da canção
Só uma voz desafinada
E a dor exausta do verão.
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Como são vagas estas horas
Do por do sol que reaparece
No halo fino das auroras
Em cada dia que amanhece
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F.T.O

27/10/2009 (DEDICATÓRIA BREVE)

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Sinto em mim deflagrada
Uma existencia irreal
De vida inteira roubada
Por qualquer coisa igual.
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Então eu me vejo naquele
Que um dia planejou
Em minha existência a dele
Não a ausência que sou.
.
Assim inteiro eu me penso
E cuja metade mantém
Um analogismo pretenso
De eu sentir-me este alguem.
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F.T.O

28/10/2009 (UM VENTO LEVE, DE PALHA)

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Há uma sombra espalhada
No fim do dia cinzento
E que só é demonstrada
Por não haver movimento.
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É só uma sombra secreta
De um algo inexistente
Por isso só se projeta
Na tarde que há na gente.
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Mas quando na noite avança
Um vento leve, de palha
Outro sentido ela alcança
E o segredo se espalha.
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F.T.O

29/10/2009 (PARÊNTESIS)

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Em cada palavra simples digo
O que a minha alma contém
Mas raramente eu consigo
Compreendê-la assim tão bem.
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E nesse estranho não saber
O que escrevo é sem sentir
Com a ilusão de que ao ler
Alguém irá me definir.
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Porque nos outros é que estão
Todas as réplicas de nós
A interminável multidão
Que nos faz crer que estamos sós.
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F.T.O

30/10/2009 (SEGREDOS NO JARDIM)

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...E a primavera descerra
Seus segredos pelo jardim;
O prado tingido de serra,
E a serra tingida de mim.
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Meus olhos trêmulos buscam
Agarrar um pouco disto
Mas as cores se ofuscam
Numa mescla, em um misto.

Em um misto, um mistério

Um eterno vendaval
Onde tudo é menos sério
Nem eu mesmo sou real.
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F.T.O

31/10/2009 (RE) ENSAIADO

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Eu não escrevo pra quem lê
E nem o faço para mim...
Escrevo aos olhos de quem vê,
E todo mundo lê-me assim.
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A coisa escrita tem um som
Muito difícl de ensaiar
É um requebrado a meio tom
E o não saber pronunciar.
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Assim escrevo a minha dança
O meu ballet caligrafia
Sou o sentido que ele alcança
Em minha dança poesia.
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F.T.O

01/11/2009 (A HORA PERDIDA)

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A hora perdida é uma seta,
Um corpo denso que restringe
Na mão esguia que a projeta
O mesmo alvo que ela atinge.
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A hora perdida é a ponte rasa,
É a travessia que excede
Ao corredor dentro da casa
E a cuja entrada ele impede.
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A hora perdida é o desalento
Das folhas velhas; temporal
Cujo pincel é a mão do vento
Que a tudo pinta tao igual.
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F.T.O

02/11/2009 (RESUMINDO)

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A pele é um corpo tecido
Aos sentidos, que se reveste
Deste trapo umedecido
Que me coube como veste.
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Ao sentir-me eu não sei
Do despir que me revele
Desta roupa que eu criei
Pra servir-me como pele.
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Sou a água sem fervura
Um retalho que não serve
Pois resiste à costura
Evapora, mas não ferve.
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F.T.O

03/11/2009 (NO SILÊNCIO QUE ME DESPERTA)

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No silêncio que me desperta
Já não existe a quietude
Somente o olhar que desconcerta
Olhando tudo e amiúde.
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A tudo olha e atentamente
Como alguém que determina
No que é visto realmente
Quando a visão se aproxima.
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E as consoantes do que vejo
Se entrepõe à solidez
Porque refletem um desejo
Que é desejar a quem as fez.
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F.T.O

04/11/2009 (O INEXPRIMÍVEL)

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E o inexprimível há de ser
Alguma coisa complicada
Porque resiste sem dizer
E se revela ao dizer nada.
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Há de ser algo que se explica
Pela razão em que contém
O olhar sutil que o modifica
E não se altera ou se mantém.
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Definitivamente, estou certo,
Ele é tão só a alternativa
Que se esconde a descoberto
E só é visto quando esquiva.
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F.T.O

05/11/2009 (SUBSTRATO)

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Eu nada busco, a intermitência
De nada ter a que buscar
Gera em mim certa freqüência
De estar aqui, noutro lugar.
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É um substrato indissoluto
Uma equação não resolvida
No sentimento, quase mútuo
Da resultante em mim perdida.
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Pois não me caibo na extensão
Que o meu corpo produziu
Da indeclinável sedução
Que a si mesmo o reduziu.
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F.T.O

06/11/2009 (REFERÊNCIA)

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O que sinto em mim é denso
Feito chuva quando molha
Faz-me crer no que não penso
E me ver em quem me olha.
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Faz-me crer que eu existo
Como a chova lá de fora
E, por não sê-la eu sei disto,
Mas de mim que sei agora.
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E como a tarde tão molhada
Entre sombras e estilhaços
Eu recolho estilhaçada
Toda vida em meus braços
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F.T.O

07/11/2009 (MISTÉRIOS DE MARFIM)

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A noite erguida em vergalhões
Lembra um país imaginário
Todo trancado em paredões;
Um mundo negro, solitário.
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Lembra clamores de uma queixa
Num grito vil, desolador
E um horizonte que não deixa
A gente ver o sol se por.
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A noite lembra tanto enfim
E sob o céu vermelho-rubro
Penso em mistérios de marfim
Que está em mim e não descubro.
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F.T.O

08/11/2009 (MEU FAZ DE CONTA)

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Num faz de contas eu anoto
Minha intenção de reencontrar
O que eu fui em alguma foto,
E que relutei por não tirar.
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Esta é uma linha transparente
O faz de conta é um meteoro
Recria a foto que há na gente
E a faz surgir em cada poro.
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Meu faz de conta  é só um conto
É só uma idéia mas, contudo,
Transforma a vida em mero ponto
E faz o nada virar tudo.
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F.T.O

segunda-feira, 21 de março de 2011

09/11/2009 (OS IDOS DE INVERNO)

segunda-feira, 21 de março de 2011
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O entardecer evita as cores
Evita o brilho, luz, calor
Evita o sol e os seus pintores,
Somente o frio é a sua cor.
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Lembro de ti e as avenidas
Trazem lembranças tão amargas
Horas distantes, coloridas
Em avenidas longas, largas.
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Penso: amanhã é outro dia
Então talvez me satisfaça
A sensação da alegria
De ver em algo certa graça.
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F.T.O

10/11/2009 (BREVIÁRIO DO ALVORECER) .

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No corpo do sol resplandece
A gota de orvalho caída
Esperando que o dia viesse
Trazendo cores e vida.
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Assim eu amei sem dizer-te
Sem que soubesses do amor
A gota de orvalho era um flerte
E tudo em ti era a cor.
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Passei, às vezes, por louco
Da gota de orvalho nem sei
De nada eu quis, só um pouco,
Pois tudo em ti eu amei.
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F.T.O

11/11/2009 (QUEM)

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Quem não sentiu-se traído
Quando a voz engasgada
Perdendo seu próprio sentido
Pra concluir-se em nada.
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Quem não sentiu-se incompleto
Quando uma forma corrente
Provou ser ele o objeto
E não o sujeito que a sente.

Quem não sentiu-se um engano
Quando tão vago e distante
Fora menor que o humano
E nada mais que um instante.
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F.T.O

12/11/2009 (GUACHE)

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Eu obtenho, em cada traço
Que a linha configura,
A poesia que eu não faço
E que entanto mais perdura.
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Se tiro as vírgula da frase
A sentença me contesta
Dá sentido a qualquer crase
Ou me diz as regras desta.

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E é neste claro movimento
Que a língua denuncia
Dobra as asas, vira vento
E subtrai-me a poesia.
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F.T.O

13/11/2009 ( UM GRITO DE LIBERDADE)

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O corpo da manhã esconde,
No chão pisado da terra
Um brado que corresponde
À voz vibrante da guerra.
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São os sonhos de liberdade
Que nascem a cada aurora
Que buscam ver na verdade
O que ela mesma ignora.
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Falam de amor, de certeza
Falam de força e de glória
O homem é a tábua da mesa
E a tábua da mesa é história.
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F.T.O

14/11/2009 (AO ESQUECER-ME QUEM EU ERA)

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Ao esquecer-me quem eu era
Fui encontrar-me todo em ti,
Em teu olhar de primavera
Mas foi assim que me perdi.
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Eram manhãs emaranhadas,
Porque em tudo parecia
Haver histórias não contadas,
Haver silêncios, poesia.
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E porque eu agora me prestava
A ser o sentido que insinua
E que em historias se contava
Mas que a vida perpetua.
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F.T.O

15/11/2009 (DA IDÉIA QUE FIZ DO AMANHECER)

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Escrevo o dia em minha mente,
Em fragmentos tão dispersos
E então percebo de repente:
O mundo cabe nos meus versos.
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Já houve tempo em que eu vivi
Sem ter alento, sede ou fome
E eu era tudo o que escrevi
No corpo vivo de meu nome.
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Lembro manhãs sempre molhadas
Porque meu hábito de escrever
Fez que elas fossem disfarçadas
Da idéia que fiz do amanhecer
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F.T.O

16.11.2009 (HORAS VAGAS)

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Nas horas paradas, observo
Sem pretender explicação
Porque em mim ainda conservo
As coisas que não virão.
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Não sei porque e nem cogito
Apenas sei que elas não vem
São como sou em meu conflito
E que sou tudo que elas tem.
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E as horas vagas mais parecem
Que tentam mesmo confundir
O que eu sou e o que conhecem
Com o que já fui sem existir.
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F.T.O

17/11/2009 (A FALTA DE TEMPO)

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A falta de tempo é a redoma,
Que torna a vida inconsistente,
É um corpo vivo mas em coma,
Que sobrevive em ser ausente.
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É um transladar de lado a lado
O lado errado do aconchego,
Que se perdeu em seu translado
E se esqueceu do desapego.
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E no transcurso do amanhã
O tempo irá em seu revés
Tornar a vida sempre vã
E de ti fará o que não és.
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F.T.O

18.11.2009 (ÀS VEZES CHOVE OU RELAMPEJA)

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Às vezes chove ou relampeja
Dentro da idéia que eu fiz
De ser apenas quem almeja
Jamais ser nada, nem feliz.
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Não ter com que se proteger
Das intempéries da má sorte
Chegar a nada e só conter
O corpo magro que comporte.
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Comporte a vida que se esvai
E onde só baste um relampejo
E a chuva esquálida que cai
No imenso nada que almejo.
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F.T.O

19/11/2009 (NÃO ESTOU EXATAMENTE CERTO)

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Não estou exatamente certo
Daquilo com que pareço
Sou quase sempre um deserto,
E às vezes me desconheço.
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Penso que eu seja a mera
Chance de vida, perdida,
Que nada têm do que espera,
Ou nada espera da vida.
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E é deste modo, confuso,
Que meu pensamento se tolhe
Pra ser o objeto de uso
Daquilo que ele recolhe.
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F.T.O

20/11/2009 (E EU ME VEJO COMO ALGUÉM)

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E eu me vejo como alguém
Cujo arquétipo se aproxima
De alguma coisa que não tem
E que tão nele predomina.
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É uma visão, é um sombreado
De uma frase onde eu li
Que tudo em mim foi infundado
E que afinal nem existi.
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E assim eu vejo a envergadura
Do que não sou mas que irá
Cavar em mim a sepultura
Pra enterrar meu o corpo lá.
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F.T.O

21.11.2009 (O SILÊNCIO DAS COISAS)

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São aves que se esqueceram
Do lugar que procuravam
Foram além e se perderam
Ou simplesmente nem voaram.
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São só aves sem paradeiro
Que debandaram no incerto
Percorreram o mundo inteiro
Sem saber que estavam perto.
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São só aves, apenas aves,
Porém nada é ser somente
Todas as coisas são entraves
Quando voar é simplemente.
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F.T.O

22.11.2009 (CORRESPONDÊNCIA)

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Escrevo uma carta para mim
Não que, de fato, eu vá ler,
Mas é que uma carta escrita assim
Fala da gente sem dizer.
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É só um relato e não agrega
Qualquer verdade apregoada
Não tem sintaxe, não tem regra
É só uma carta e mais nada.
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Porém se me perco na cadência
Por um detalhe que omito
É por faltar-me a transparência
De escrever-me sem tê-lo dito.
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F.T.O

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23.11.2009 (COSMONAUTA)

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Finjo que sou um cosmonauta
Cruzando espaços e quimeras...
Navego os céus em noite alta
No brilho intenso das esferas
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Invento os pontos que atinjo
Nos redemoinhos do espaço
Finjo até mesmo que não finjo
Que estou em tudo o que faço

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Mas quando atinjo a nevoenta
Manhã sem graça, já não sei,

Se o que é fingido se inventa,
Eu devo crer que me inventei.
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F.T.O

24.11.2009 (VELHO BARCO)

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No velho barco ainda agoniza
A onda morta, sem ação,
De uma memória que divisa
O nunca ser a embarcação.
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Não ser é algo agonizante,
É a resultante que abarca
A dor excessiva e conflitante
Do peso alusivo de uma marca.
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Pois todo tempo é uma cava,
A greta aberta em um charco,
Que suja sempre quando lava
Tornando tudo um velho barco.
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F.T.O

25.11.2009 (SONOLÊNCIA)

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...e eu converti-me nisto tudo
Que hoje apenas é lembrado
Como o final de um filme mudo
E um livro velho em mal estado.
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Um riso quieto e maltrapilho,
De um arlequim que segue torto
No longo estreito de um trilho
E busca ali o seu conforto.
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E nesta estranha pequenez
Da coisa vista tão de fora
Não busco nem a insensatez
Pois até ela me ignora.
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F.T.O

26.11.2009 (DECLARAÇÃO DO ALVORECER)

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O meu olhar roubado ao teu
não é somente um olhar
Mas um rubor que se escondeu
Entre a manhã, aurora e mar.
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Pois as manhãs derramam óleos
Sobre a varanda de tecidos
Da cor perdida de teus olhos
Em meus olhares escondidos.
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É natural que eu não te veja
Apenas sinta quando vens
Que és a manhã e o sol te beija
Não tenho nada, tu o tens.
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F.T.O

27/11/2009

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A minha vida sem estética
certamente se escondeu
Numa frase tão poética
Que não é ela e nem sou eu
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Vejo assim que se tornara
O, em mim, desconhecido
Que a frase não mascara
Nem faz menos corrompido.
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E se foi escrita ou se não
Vejo apenas a inconstância
De ter sempre um padrão
De tão pouca importância
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F.T.O

28/11/2009

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Há um toque de recolher
em cada boca fechada
Que tanta coisa a dizer
E cada palavra engasgada
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Existe um sinal de alerta
Em cada beco, avenida
Em cada frase encoberta
Em cada esquina da vida
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Existe um sino que toca
E cada mente que pensa
E o pensamento coloca
em cada lenço mordaça
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F.T.O

29/11/2009

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O tempo coloca em meus lábios
palavras que eu nunca disse
Não são sermões, nem são sábios
São confissões, é tolice.
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São coisas que eu guardei
Para dizer-te um dia
As mais puras tolices, eu sei
Mas mesmo assim eu diria.
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Passou-se o tempo no entanto
E eu nada ousei revelar
Pois descobri que o encanto
Vem do sentir sem falar.
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F.T.O

30.11.2009 (INSUBORDINAÇÃO)

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Eu vou beber a água da fonte
Que existe quando orvalha
Entre a cortina do horizonte
E a neblina que a espalha.
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E vou beber até cansar-me
Eu seguirei na exaustão
Até quando não me alarme
Com o que todos pensarão.
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Vou beber a água corrente
Que se extingue no regato
Até quando a experimente
Como ela o é e não de fato
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F.T.O

01/12/2009

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É o vento raro de outras eras
Que faz a noite ser mais calma
Tornando o canto das esferas
A voz serena de minha alma.
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Penso em ti e sinto o peso,
O leve peso de existir
Neste pavio enfim aceso
Minha vontade em te seguir.
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Então irei aonde estás
Atravessando caos e mágoas
Te seguirei, me seguirás
No mais profundo dessas águas.
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F.T.O

02.12.09 (CONCERTO AO LUAR)

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Te vi á noite entre as estrelas
Então não soube precisar
Se me perdi de então ao vê-las
Ou me esqueci por te olhar.
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E a noite calma desatenta
Não percebeu que te esconder
Cria a razão que fundamenta
A esperança de te ver.
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Pois há no brilho do invisível
A doce glória da conquista
Que dota ao ser mais divisível
A sensação da coisa vista.
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F.T.O

03.12.09 (PAS DE DEUX)

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O teu silêncio é como a dança
Que meu silencio apenas sente
Num véu aberto que alcança
Este balé que há na gente.
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Então seu corpo se levanta
E num movimento ritmado
Ordenadamente se agiganta
E se coloca do meu lado.
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E assim igual ao instrumento
Retém o fino e raro toque
Do corpo esguio em movimento
Quando a dança o provoque
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F.T.O

04.12.09 (PERENIDADE)

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Teu rosto repousa transparente,
como pintura numa lousa...
Nada esconde apenas sente,
Então por isso só repousa.
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E os olhos fitam no incerto
De uma forma que parece
Que o infinito está tão perto
E nada mais, tudo emudece.
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Se a alguém coubesse definir
Tudo a dizer seria vão...
Nada é mais belo que sentir
O que não tem definição.
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F.T.O

05.12.09 (SARAU)

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Eu te desenho em minha mente,
Te redecoro a cada linha,
Porque você naturalmente
Já é tão sua quanto minha.
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Te beijo a fronte numa valsa,
E te convido pra dançar
Teu corpo leve então realça
O meu esforço em te alcançar.
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Te redecoro em cada ponto
Só pra te ver como tu és
E pra entender que estou pronto
Pra por meu mundo a teus pés.
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F.T.O

06.12.09 (ESQUÁLIDO)

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Há coisas que só acontecem
Porque foram esquecidas;

Instantes que não parecem
Freqüentar as nossas vidas.
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São detalhes que a gente
Simplesmente não os via,
Ou de os ver constantemente
Se esqueceu porque sabia.
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Porém quando tudo passa,
Ou que enfim desaparece,
É que vemos toda a graça
De uma coisa que acontece,
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F.T.O

07.12.09 (ESPERA)

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O tempo agora é de dar tempo
De não sair no vendaval,
De ser somente um passatempo,
Relva perdida no quintal.
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O tempo agora é de ser nada,
Maçã colhida no jardim,
Buraco aberto na calçada,
De ter você perdida em mim.
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O tempo agora é uma espera
Que cola o rosto transparente
No cume alto da cratera
Deste vulcão que há na gente.
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F.T.O

08.12.09 (BRUMAS)

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Lembrei-me de ti esta manhã
E a brisa leve perfumada
Trazia aromas de hortelã
Com flores brancas na estrada
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E a névoa densa e submersa
Tinha seu cheiro, seu sorriso
Um resto ainda da conversa
E uma canção que idealizo.
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Assim me fiz esta lembrança
Porque senão a esqueceria
Na frase feita de uma dança
Que o teu silencio dançaria.
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F.T.O

09.12.2009 (SOLAR)

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Hoje acordei com a certeza
De que nada vive no depois
Que o mundo inteiro é correnteza
Que desemboca entre nós dóis.
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Que as horas vivem um segredo
Que ninguém pode revelar
E a flor que vive no rochedo
É a porta aberta para o mar.
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Hoje acordei, e sem que eu visse
Todo o meu mundo acordou
Com a certeza que eu te disse
Um pouco disto que eu sou.
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F.T.O

10.12.2009 (CLARIDADE)

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Hoje entendi o que não vejo
A rara e dúbia intensidade
Entre o amor e o desejo
E nenhum deles na verdade.
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O teu silencio me rodeia
E o som diáfano do dia
É um estopim que incendeia
Tudo que a vida silencia.
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Te digo coisas mas esqueço
De te dizer principalmente
Que estás além do que mereço:
És o caminho à minha frente.
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F.T.O

11.12.2009 (LIBERDADE)

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Tenho saudade a todo instante
como o orvalho tem da flor
É a dor confusa e tão constante,
A qual chamamos de amor.
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Não sei porquê, às vezes queima
Em uma ardência consumida
Chama sutil que tanto teima
E incendeia a minha vida.
.
É uma torrente que derrama
E a tudo tenta consumir
Na sempre quieta e mesma chama
Que fê-la um dia existir.
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F.T.O

12/12/2009

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Eu decifrei o teu mistério
Recalculei o teu sentido
Retornarei ao teu império
Porque o tive já perdido
.
Tu es o preço claro e justo
Que mostra à minha pequenez
Que toda coisa tem um custo
Tem seus segredos e porques
.
Ajuntarei a minha carta
a tua carta de alforria
Estmos livres ante a farta
Loucura insana da alegria.
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F.T.O

13/12/2009

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Estás em mim o tempo todo
Teu sono é leve a quem o perturbe...
Anjos, marfim, argila e lodo
Vozes que cantam pela urbe.
.
Estas em mim como a promessa
De um passado incalculavel
E que apenas se expressa
Porque em nós é interminavel.
.
Estás, estou... sempre estamos
Num mesmo tempo e lugar
São só lugares que passamos
Para um dia nos lembrar.
.
F.T.O

14/12/2009

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A minha ausencia se predece
Da solidão que me exila
Num sentimento que me impede
De esquecer-me ao senti-la.
.
Eu penso em ti, esta distancia
Apenas sei que determina
A mais finita inconstancia
E tudo que fazéaproxima
.
Te Sinto toda, teu perfume
Terna fragancia de absinto
E minhas horas tem ciume
Por não sentir o que eu sinto
.
F.T.O

15/12/2009

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Se foi o dia em que eu sentia
A solidão emaranhada
A quase tudo que eu fazia
E à certeza de ser nada.
.
Os tempos voam, cada passos
parecem mesmo conspirar
Que asas surgem de meus braços
E tudo em mim querer voar
.
Mas vejo em ti meu baluarte
Tudo que vem depois da morte sorte
Pois há de i em toda parte
Seja na vida ou na morte
.
F.T.O

16/12/2009

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Tu és em mim como o horionte
Quando o mundo perder a cor
água que escorre pela fonte
A esencia pura do sabor
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A minha sina e a liberdade
O talismã que eu carrego
Espera incerta, a saudade
Um ponto vago, dúbio e cego.
.
A minha escrita, minha historia
não saber quem escreveu
Que somos nós esta memória
Escrita em ti e lida em mim.
.
F.T.O

17/12/2009 (VORAZ)

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Vou encontrar teu ponto certo
vou te achar onde perdi
onde em ti fui descoberto?
onde em mim eu te esqueci?
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Vou te buscar na densa bruma
no vendaval em movimento
Pra ver se a gente se acostuma
A não ser mais esquecimento.
.
E Vou inventar outra maneira
pra começa de onde parei
E ainda que leve a vida inteira
Vou te buscar onde deixei.
.
F.T.O

18/12/2009

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O meu corpo chama pelo teu
Em uma porta sem saída
Que responder ao corpo meu
É tão somente dar-lhe vida.
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É dar alento ao moribundo
É dar-lhe apenas um lugar
No palco imenso deste mundo
Onde ele vá contracenar.
.
Os corpos falam, se expressam
Se comunicam igualmente
Porém às vezes só confessam
Este furor que há na gente.
.
F.T.O

19/12/2009

.
o mar é feito dos instantes
em que podaiamos lembrar afundar
porque já fomos navegantes
voce e eu, o fundo e o mar
.
Nós dois já fomos argonautas
Em meio a mares caudalosos
Pra refletir as noites altas
em precipicios perigosos
.
Fostes meu barco, minha guia
Minha certeza e minha fé
E o furacão que desafia
A descobrir o que ele é
.
F.T.O

20/12/2009 (EQUAÇÃO)

.
Talvez a gente nem combine
E só pretenda começar
Para que um ao outro ensine
O modo certo de se amar.
.
Talvez a gente nem suporte
E só pretenda insistir
Para tornar ao outro forte
E esquecer de desistir.
.
E talvez a gente se complique
Pela mais simples equação
E cujo motivo só a explique
A voz que está no coração.
.
F.T.O

21/12/2009 (NÃO MAIS PODIA ESQUECER)

.
A rua de pedra esconde,
Em pavimentos de brisa,
Um sem porque nem aonde
E que de nada precisa.
.
São os sussurros no ar
Que do silencio me arrasta
Ao que não sei escutar
Ou que ouvi e me basta.
.
Mas de te ouvir em nós dois
É que eu fui perceber
Que em repetidos depois
Não mais podia esquecer.
 .
F.T.O

22/12/2009 (REVELAÇÃO)

.
Não estou certo de que possa
Dizer aquilo que sinto,
A intimidade nunca é nossa,
E como a água na poça
Às portas de um labirinto.
.
Que diria do que é meu
Se pouco de meu ele tem
E o que fiz, não sendo eu,
Um outro me precedeu
Fazendo o mesmo também.
.
Assim que estranho pareça
Não me posso avaliar...

Sou quem mais me desconheça
Objeto que se esqueça
Sobre a mesa de jantar.
.
F.T.O

23/12/2009 (MEU OSTRACISMO)

.
Vou aceitar meu ostraciso
E que me chamem de ninguém,
Serei somente um mecanismo,
Um velho nome de batismo,
Uma notícia que não vem.
.
Vou aceitar meu banimento
Pra não lembrarem mais de mim
Assim serei o esquecimento
A velha estátua de cimento
Envelhecida no jardim.
.
Vou aceitar as condições
Que velhos nomes impuseram
Mesmo sabendo que as razões
Apenas são opiniões
Do veredicto que ela deram.
.
F.T.O

24/12/2009 (O BRILHO DOS OLHOS DELA)

.
O brilho dos olhos dela,
Tem algo, não sei o que,
Que tanto esconde e revela,
Quando ela passa e me vê.

E o meu olhar insinua,
O que não posso pensar,
Do brilho que continua,
Mesmo depois de passar.

Como não sei abordá-la,
Quisera apenas supor,
Que este encontro sem fala,
É um começo de amor.
.
F.T.O

25/12/2009 (EU SOU METADE)

.
Eu sem voce sou só metade
Metade de um algo concebido
Não sou mentira nem verdade
Sou o que sou, inconcluído.
.
Sou a distância entre o véu
O ponto crítico da borda
Que rodopia em carrossel
Porém esquece o que recorda
.
Sou a urgência do que urge
Um vendaval, um torvelinho
Um grito pasmo que ressurge
Em cada palmo do caminho.
.
F.T.O

26/12/2009 (PRA GENTE CRER QUE NÃO FOI NADA)

.
Em cada onda do mar habita
Um sentimento sem razão
Que o vão da praia regurgita
Para reter sua vazão.
.
Vou sacudir meus pavimentos
E todas ondas que habitei
Irão ruir sem movimentos
Por cada grito que calei
.
E em tudo existe esta latencia
De alguma coisa propalada
No veu calado da existencia
Pra gente crer que não foi nada.
.
F.T.O

27/12/2009 (E ASSIM SÃO OS CORAÇÕES)

.
E assim são os corações;
Tão desiguais e aparentes
Porque nas mesmas emoções
Têm reações tão diferentes
.
Em um momento desprendido,
Percebe tudo que se passa,
Porém faz coisas sem sentido
Embora crêem que não as faça.
.
E assim são, e apenas são
E isto é tudo que convence
Da gente-lo em si ou não
E não saber se nos pertence
.
F.T.O

28/12/2009 (CONFIDÊNCIA)

.
Existe em mim o que não conto
Ponto e virgulas que criei
Para fingir que estive pronto
Ou que enfim me preparei.
.
São pontos vagos ou calados
Virgulas perdidas no papel
Onde deixei mal anotados,
Fichas vendidas a granel.
.
Falar de mim é quase igual
A referir-se a coisa alguma
Não tem sentido e como tal
O nada é tudo que a resuma.
.
F.T.O

29/12/2009 (E A GENTE É MESMO DIFERENTE)

.
...e a gente é mesmo diferente
Pois em momentos desiguais,
Fazemos coisas comumente
Que outros já não fazem mais.
.
Quando percebo que me olhas
Buscando tudo em nada ver
Sinto-me um livro que desfolhas
Porque só tu o sabes ler.
.
Então daquilo que sabemos
Tão pouca coisa se contrasta
Porque nós dois apenas lemos
O livro do outro e isto basta.
.
F.T.O

30/12/2009 (AS SOMBRAS FALAM NO ESCURO)

.
As sombras falam pelo escuro
Esta é a voz que a noite tem...
Vem de um silêncio quase puro
Pois sai da boca de ninguém.
.
É uma voz confusa e rouca
Tão absurda de se ouvir
Porque o silêncio fere a boca
Quando alguém quer repetir.
.
Escuto a noite, e ela diz
Numa frequencia quase morta
Meu verso mudo e infeliz
Jamais escrito e pouco importa.
.
F.T.O

31/12/2009 (NUVENS CARREGADAS)

.
...e assim as nuvens carregadas
Vêm perturbar os meus sentidos
Me acordando às madrugadas
Em meio aos sonhos repetidos
.
E tudo o que vejo é simplesmente
Uma ranhura que aproxima
O que eu não vejo plenamente
Sinta na pele e o não exprima
.
E o inexprimível é como ter
Alguma coisa que equivale
Ao ter um nada pra dizer
Quando enfim tudo se cale.
.
F.T.O

01/01/2010 (TE PROCUREI)

.
De procurar-te e sempre e tanto
A minha vontade transformou-se
Em um silencio mudo e branco
Ou algo igual que assim o fosse.

Eu te busquei em noite escura
E pelas auroras mais tardias
Que descobri que na procura
Estava o rumo aonde ias.
.

E te busquei em meio a gestos
Em mar revolto, embarcação,
Pra descobrir em ti meus restos
E encontrar em mim razão.
.
F.T.O

02/01/2010

.
Eu me sinto às vezes tão igual
A um deserto, a um cercado,
Ou aos mourões de um curral
Que prendem a si e não ao gado.
.
Porém não sei se realmente,
Algo de gado há em nós
Apenas sei que há na gente
Um matadouro, um algoz.
.
E isto é igual a um vasilhame
Que reterá ou não se perca
Esta couraça de arame
Que transformou-nos numa cerca
.
F.T.O

03/01/2010 (A MÃO DA TARDE CINZELA)

.
E a mão da tarde cinzela
Em sua vil lucidez
A imagem que é vista por ela
Ou que por ela se fez.
.
É uma visão que se cria
Ou que apenas adorna
O que o objeto seria
E aquilo que ele se torna
.
Assim a arte se espalha
Em uma estranha estrutura
E a mão da tarde que a entalha
Faz parte da escultura.
.
F.T.O

04/01/2010 (...AOS VELHOS CANHÕES)

.
As sombras caíram no ocaso
Do dia que já passou
Num vôo tão curto e tão raso,
E que tão pouco perdurou.
.
E a nau perdida em um ponto
Singrando por alheias sagas
Viraram apenas um conto
Relido nas horas vagas.
.
Mas o meu coração inexplorado,
Alenta aos velhos canhões
Com um conto apenas contado
No encontro de corações.
.
F.T.O

05/01/2010 (HIALINO)

.
A névoa na tarde, à toa,
Tinge as casas de marfim
Só pra eu saber que nevoa
Ou apenas vê-la assim.
.
E ao vê-la não defino
O lugar pra onde vai
Nem me vejo ou imagino
Nessa nevoa quando cai.
.
E assim me faço retraído
Por sabê-la em demasia
Neste rastro esquecido
E onde antes nada havia.
.
F.T.O

06/01/2010 (LONGITUDINAL)

.
O entardecer é uma promessa
De que o dia continua
De que ele sempre recomeça
E outras vezes nem recua
.
E cada instante é uma prova
É uma sorte que nos brinda
Com a profusão que se renova
E cujo fim não veio, ainda.
.
E como a luz que se radica
Na flor do orvalho refletida
Tudo que vai apenas fica
Na eterna ausência repetida.
.
F.T.O

07/01/2010 ( E ASSIM RESSURGE...)

.
E assim ressurge a madrugada,
(Velho rabisco que mantenho
De alguma forma ordenada
N'algum esboço de desenho).
.
E assim se esvai a escuridão
Nenhum desenho a mantém
Os homens nunca a lembrarão
E ela existe pra ninguém.
.
E assim ressurge o dia claro
A vida toda é como um vicio
Como um perfume nobre e raro
Que não permite desperdício.
.
F.T.O

08/01/2010 ( AS CALÇADAS FRIAS ONDE PASSO)

.
As calçadas frias onde passo
Fazem lembrar a prateleira
Da casa velha, sem terrarço,
Onde vivi a vida inteira.
.
Água escorrendo no telhado,
E um chumaço de jornais
Num velho canto abandonado
Sobre um arranjo de corais.
.
Depois de tanto, agora sei,
A consonância de meus dias
É de jornais que não lerei
E de calçadas sempre frias.
.
F.T.O

09/01/2010

.
Todas as coisas que eu te disse
Ainda soam por interiras
Como se o tempo se incumbisse
De não torna-las verdadeiras.
.
Pois todas elas são revistas
Entre o ver e o ocultar
Entre as pegadas e as pistas
Do que eu sinto sem falar.
.
A nossa vida é uma cortina
Um candelabro na janela,
Chama que mata a parafina
Para extrair o fogo dela.
.
F.T.O

10/01/2010 (EU DESAPRENDO O QUE É SENTIR)

.
Eu desaprendo o que é sentir
E ainda não sei reaprender
Tudo o que sou é o transmitir
Daquilo que não sei dizer.
.
Cometo erros francamente
Que se um outro os conhecesse
Veria a mim completamente
Como se o erro o descrevesse.
.
E tudo que sei ou que senti,
Além das coisas repetidas,
Estão as falhas que esqueci
E ainda não foram cometidas.

.
F.T.O

11/01/2010 (POR MAIS QUE A NOITE SE AQUIETE)

Por mais que a noite se aquiete
Eu busco ao dia que agite
Ao que me falta ou complete
Ao que em mim é limite...
.
...No descompasso mais largo
Verei ao sol por se por...
Velho, azedo ou amargo
Tão decadente e sem cor.
.
Por mais que a noite me tente
Inda serei como louco
Que tenta ser ou invente
Ao nada além de ser pouco.

12/01/2010 (ALGUMA ESTRELA)

ALGUMA ESTRELA
.
E sei, alguma estrela se esconde,
No fundo falso do que sou
E ela é tão igual ou coresponde
Ao que em mim jamais mudou.
.
É o lado oposto, é o contraponto
Da pedra nunca cinzelada
É o meio termo do confronto
Entre ser algo em sendo nada.
.
E nesta estrela se reflete
Como na vidraça umedecida
A velha imagem que repete
Que se perdeu em minha vida.
..
F.T.Oliveira

13/01/2010 (A CHUVA CAINDO NO LAGO)

.A chuva caindo no lago
Diz, de modo diferente,
Que ondas, em mim, as trago
Por não tê-las realmente.
.
Ele me fere com a adaga
Em cortina transformada
De indiferente e vaga
Grafada sobre o meu nome.
.
E embora eu pouco o diga
Essa dor me leva a crer
Que enfim é a mão amiga
Que me ensina em meu doer.

14/01/2010 (IMPONDERÁVEL)

I
.
Quem sou eu? - Somente sabe
Ou simplesmente imagina
Que minha alma já não não cabe
Nesta janela da retina.
.
Quem somos nós? Assim define
O instante vindo logo após
De quando alguém se imagine
"Não somos um, nós somos nós".
.
Aonde irei? Não sei se posso
Falar de algo visto em mim
Seja o que seja - qualquer troço
Disto que fui ao "ser assim"
.
II
.
De longe, na praia deserta,

Cuja areia é branca e fria,
Vive a ilha recoberta
De tormentos e magia.
.
E na distância, adormecida,
Nos silêncios cambaleia
A maré mais esquecida
Em seus sonhos de areia.
.
Mas o mar distante vê
Neste mundo em desalento
Que os mundos que ele crê
São tragados pelo vento.

15/01/2010 (A ESTRADA ESCONDE)

A estrada esconde fora
O caminho que vai dentro
Confundindo a quem explora
E afastá-lo de seu centro.
.
E o seguir-se se traduz
Em não crer que tanto faz
Que um rumo se conduz
Ao porvir do "algo mais"
.
E assim morre na estrada
Tudo quanto se empregue
Por não vê-la abandonada,
Por fiar-se em quem a segue.

16/01/2010 (O OLHO D'ÁGUA)

O olho d´água reflete
A cara magra da lua
Ou somente se repete
A imagem que é sua.
.
Que tão vaga distancia
Do que não se reconhece
Pois reflete a nostalgia
Sem saber com que parece.
.
"Tudo que mata conforta"
E a imagem, sendo mágoas,
Desconhece que é morta
Na dor profunda das águas.

17/01/2010 (FINA CAMADA)

A fina camada de veludo
De meus sentidos se constrói
Do pouco que sou e de tudo
Que sinto em mim e que dói.
.
E é neste torpe sentimento
Ininterrupto e frequente
Que eu mim experimento
O sentido de estar ausente.
.
E embora me pese encanto
D que em mim se comprova
A dor me dói e dói tanto
Que sempre parece ser nova.

19/01/2010 (NÃO É SÓ...)

Não é só uma lágrima, é mais
É mais que isso, e é somente,
A simples dor que os mortais
Todos a sentem , igualmente..
.
Não é só a dor (ou pelo menos),
No limiar de uma etapa,
Nos sentimentos mais pequenos,
Toda essa dor se nos escapa
.
Não é só isso. e nem é só
Uma tristeza que nos sai
E que nos faz ter muita dó
Da estranha lágrima que cai.

(DEDUÇÃO) 20/01/2010

..Por entre as curvas, uma curva
Um céu de estrada, desalentos
A imagem minha clara- turva
Estrada é chão de sentimentos.
.
A mim me chamam pelo nome
Um nome estranho para mim
Uma angústia que tem fome
Um bastião, outo e marfim.
.
Que vou dizer-te, minha cara,
Se a palavra não traduz
O quanto é vaga a coisa rara
E que o outro em n´s deduz.

(O DOCE AMARGO DE VIVER) 21/01/2010

.Meu rosto cala o sofrimento
E o sentimento de perder
Na estrada afora de um momento
O DOCE AMARGO DE VIVER.
.
A vida flui, reflui, Não passa
Do ponto mórbido que agarro
Feito as cortinas de fumaça
Que se espalham de um cigarro.
.
Eu sou assim como este fumo
Uma metade estranha, louca,
A qual me entrego e  acostumo
Como a fumaça em minha boca

(HABITUAL) 22/01/2010

.HABITUAL
.
Um rosto. Silêncio! Um rosto
Na pálida luz de uma lua
Denota a dor e o desgosto
Em uma dor que não é sua.
.
Contrai-se e, alguma alusão,
Do que dissimula ou reflete
Transforma as coisas que são
Em outas que nele repete.
.
Contrai-se a humana criatura
Como se o mundo ali cavasse
A sua própria sepultura
Na dor contida em sua face.

(SOU EU O PÓ) 23/01/2010

.SOU EU O PÓ
.
Sou eu o pó que o vento leva
Da umidade que ainda vive
Tão ancestral e tão longeva
No antepassado que não tive.
.
Toda tristeza vem-me aos olhos
Quando o passado os retrai
Como sargaços e abrolhos,
Em uma lagrima que cai.
.
Eu sou o pó e quem me olha
Por nada ver se entretém
Não vê a lagrima que molha
Nem vê aquela que não vem
.
II
.
Eu não conheço a atitude
Apenas sei que inexiste
E enquanto eu jamais a mude
Ele está no que consiste
.
Não é a lágrima que rola
Não é o modo de se vê-la
Mas a intenção que se izola
Ao ver um céu em cada estrela
.
É impossivel não mudar
Não ser passado nem presente
Sair de cena, não voltar,
Estar em cada coisa ausente.
.
II
.
Sou eu o pó, uma poeira
Que a mão do vento subtrai
Minha metade quase inteira
Na noite íngreme que cai.
.
Direi a quem não me conhece
Que nunca fui reconhecido
Sou como a coisa que se esquece
Por não conter nenhum sentido.
.
Sou eu os cantos da estrada
Cantos que todos pisarão
E levarão na caminhada
Toda a lembrança do que são.

terça-feira, 22 de março de 2011

(DIVISÃO) 24/10/2009

.
As flores por sobre a mesa
E os longos dias de inverno
Possuem a mesma tristeza
De um frio longo e eterno.
.
Numa cadência ou ritmo

Eu vejo as flores - Morrer
Por sobre o eixo marítimo
Cansado de mim... e chover.
.
E por sobre a mesa só resta
um pouco, creio, de mim:
Olhar que vê pela fresta
Para não ver nada enfim.
.
F.T.O

(PRECE ANTIGA) 25/10/2009

I
.
Eu bebo o sangue da uva
Eu bebo o ceu de carmim
Pois o que sou coadjuva
Com o que não tenho em mim
.
Eu sinto em mim o intervalo
Alguém correndo na brisa
Em uma canção de orvalho
Pela manhã imprecisa.
.
Não posso ouvir a cantiga
Que tem o sopro do vento
Em uma prece antiga
Que vive em cada momento.
.
II
.
O teu silêncio tem o cheiro
Que tem o ar do amanhecer
Que a gente sente por inteiro
Porém, jamais, o pode ver.
.
Pois tem segredos combinados
intercalados numa voz
De quando foram segredados
Porque falavam sobre nós.
.
Eu posso crer que justifique
Porém não sei se saberei
Ver a fragrância que ainda fique
Em tudo aquilo que falei.
.
Oliveira.F.T

26/10/2009 (EM CADA DIA QUE AMANHECE)

.
E a minha noite se fez dia
de uma noite anterior
Por uma estranha alegoria:
A cor do sol em uma flor
.
Não encontrei a minha estrada
Na brisa leve da canção
Só uma voz desafinada
E a dor exausta do verão.
.
Como são vagas estas horas
Do por do sol que reaparece
No halo fino das auroras
Em cada dia que amanhece
.
F.T.O

27/10/2009 (DEDICATÓRIA BREVE)

.
Sinto em mim deflagrada
Uma existencia irreal
De vida inteira roubada
Por qualquer coisa igual.
.
Então eu me vejo naquele
Que um dia planejou
Em minha existência a dele
Não a ausência que sou.
.
Assim inteiro eu me penso
E cuja metade mantém
Um analogismo pretenso
De eu sentir-me este alguem.
.
F.T.O

28/10/2009 (UM VENTO LEVE, DE PALHA)

.
Há uma sombra espalhada
No fim do dia cinzento
E que só é demonstrada
Por não haver movimento.
.
É só uma sombra secreta
De um algo inexistente
Por isso só se projeta
Na tarde que há na gente.
.
Mas quando na noite avança
Um vento leve, de palha
Outro sentido ela alcança
E o segredo se espalha.
.
F.T.O

29/10/2009 (PARÊNTESIS)

.
Em cada palavra simples digo
O que a minha alma contém
Mas raramente eu consigo
Compreendê-la assim tão bem.
.
E nesse estranho não saber
O que escrevo é sem sentir
Com a ilusão de que ao ler
Alguém irá me definir.
.
Porque nos outros é que estão
Todas as réplicas de nós
A interminável multidão
Que nos faz crer que estamos sós.
.
F.T.O

30/10/2009 (SEGREDOS NO JARDIM)

.
...E a primavera descerra
Seus segredos pelo jardim;
O prado tingido de serra,
E a serra tingida de mim.
.
Meus olhos trêmulos buscam
Agarrar um pouco disto
Mas as cores se ofuscam
Numa mescla, em um misto.

Em um misto, um mistério

Um eterno vendaval
Onde tudo é menos sério
Nem eu mesmo sou real.
.
F.T.O

31/10/2009 (RE) ENSAIADO

.
Eu não escrevo pra quem lê
E nem o faço para mim...
Escrevo aos olhos de quem vê,
E todo mundo lê-me assim.
.
A coisa escrita tem um som
Muito difícl de ensaiar
É um requebrado a meio tom
E o não saber pronunciar.
.
Assim escrevo a minha dança
O meu ballet caligrafia
Sou o sentido que ele alcança
Em minha dança poesia.
.
F.T.O

01/11/2009 (A HORA PERDIDA)

.
A hora perdida é uma seta,
Um corpo denso que restringe
Na mão esguia que a projeta
O mesmo alvo que ela atinge.
.
A hora perdida é a ponte rasa,
É a travessia que excede
Ao corredor dentro da casa
E a cuja entrada ele impede.
.
A hora perdida é o desalento
Das folhas velhas; temporal
Cujo pincel é a mão do vento
Que a tudo pinta tao igual.
.
F.T.O

02/11/2009 (RESUMINDO)

.
A pele é um corpo tecido
Aos sentidos, que se reveste
Deste trapo umedecido
Que me coube como veste.
.
Ao sentir-me eu não sei
Do despir que me revele
Desta roupa que eu criei
Pra servir-me como pele.
.
Sou a água sem fervura
Um retalho que não serve
Pois resiste à costura
Evapora, mas não ferve.
.
F.T.O

03/11/2009 (NO SILÊNCIO QUE ME DESPERTA)

.
No silêncio que me desperta
Já não existe a quietude
Somente o olhar que desconcerta
Olhando tudo e amiúde.
.
A tudo olha e atentamente
Como alguém que determina
No que é visto realmente
Quando a visão se aproxima.
.
E as consoantes do que vejo
Se entrepõe à solidez
Porque refletem um desejo
Que é desejar a quem as fez.
.
F.T.O

04/11/2009 (O INEXPRIMÍVEL)

.
E o inexprimível há de ser
Alguma coisa complicada
Porque resiste sem dizer
E se revela ao dizer nada.
.
Há de ser algo que se explica
Pela razão em que contém
O olhar sutil que o modifica
E não se altera ou se mantém.
.
Definitivamente, estou certo,
Ele é tão só a alternativa
Que se esconde a descoberto
E só é visto quando esquiva.
.
F.T.O

05/11/2009 (SUBSTRATO)

.
Eu nada busco, a intermitência
De nada ter a que buscar
Gera em mim certa freqüência
De estar aqui, noutro lugar.
.
É um substrato indissoluto
Uma equação não resolvida
No sentimento, quase mútuo
Da resultante em mim perdida.
.
Pois não me caibo na extensão
Que o meu corpo produziu
Da indeclinável sedução
Que a si mesmo o reduziu.
.
F.T.O

06/11/2009 (REFERÊNCIA)

.
O que sinto em mim é denso
Feito chuva quando molha
Faz-me crer no que não penso
E me ver em quem me olha.
.
Faz-me crer que eu existo
Como a chova lá de fora
E, por não sê-la eu sei disto,
Mas de mim que sei agora.
.
E como a tarde tão molhada
Entre sombras e estilhaços
Eu recolho estilhaçada
Toda vida em meus braços
.
F.T.O

07/11/2009 (MISTÉRIOS DE MARFIM)

.
A noite erguida em vergalhões
Lembra um país imaginário
Todo trancado em paredões;
Um mundo negro, solitário.
.
Lembra clamores de uma queixa
Num grito vil, desolador
E um horizonte que não deixa
A gente ver o sol se por.
.
A noite lembra tanto enfim
E sob o céu vermelho-rubro
Penso em mistérios de marfim
Que está em mim e não descubro.
.
F.T.O

08/11/2009 (MEU FAZ DE CONTA)

.
Num faz de contas eu anoto
Minha intenção de reencontrar
O que eu fui em alguma foto,
E que relutei por não tirar.
.
Esta é uma linha transparente
O faz de conta é um meteoro
Recria a foto que há na gente
E a faz surgir em cada poro.
.
Meu faz de conta  é só um conto
É só uma idéia mas, contudo,
Transforma a vida em mero ponto
E faz o nada virar tudo.
.
F.T.O

segunda-feira, 21 de março de 2011

09/11/2009 (OS IDOS DE INVERNO)

.
O entardecer evita as cores
Evita o brilho, luz, calor
Evita o sol e os seus pintores,
Somente o frio é a sua cor.
.
Lembro de ti e as avenidas
Trazem lembranças tão amargas
Horas distantes, coloridas
Em avenidas longas, largas.
.
Penso: amanhã é outro dia
Então talvez me satisfaça
A sensação da alegria
De ver em algo certa graça.
.
F.T.O

10/11/2009 (BREVIÁRIO DO ALVORECER) .

.
No corpo do sol resplandece
A gota de orvalho caída
Esperando que o dia viesse
Trazendo cores e vida.
.
Assim eu amei sem dizer-te
Sem que soubesses do amor
A gota de orvalho era um flerte
E tudo em ti era a cor.
.
Passei, às vezes, por louco
Da gota de orvalho nem sei
De nada eu quis, só um pouco,
Pois tudo em ti eu amei.
.
F.T.O

11/11/2009 (QUEM)

.
Quem não sentiu-se traído
Quando a voz engasgada
Perdendo seu próprio sentido
Pra concluir-se em nada.
.
Quem não sentiu-se incompleto
Quando uma forma corrente
Provou ser ele o objeto
E não o sujeito que a sente.

Quem não sentiu-se um engano
Quando tão vago e distante
Fora menor que o humano
E nada mais que um instante.
.
F.T.O

12/11/2009 (GUACHE)

.
Eu obtenho, em cada traço
Que a linha configura,
A poesia que eu não faço
E que entanto mais perdura.
.
Se tiro as vírgula da frase
A sentença me contesta
Dá sentido a qualquer crase
Ou me diz as regras desta.

.
E é neste claro movimento
Que a língua denuncia
Dobra as asas, vira vento
E subtrai-me a poesia.
.
F.T.O

13/11/2009 ( UM GRITO DE LIBERDADE)

.
O corpo da manhã esconde,
No chão pisado da terra
Um brado que corresponde
À voz vibrante da guerra.
.
São os sonhos de liberdade
Que nascem a cada aurora
Que buscam ver na verdade
O que ela mesma ignora.
.
Falam de amor, de certeza
Falam de força e de glória
O homem é a tábua da mesa
E a tábua da mesa é história.
.
F.T.O

14/11/2009 (AO ESQUECER-ME QUEM EU ERA)

.
Ao esquecer-me quem eu era
Fui encontrar-me todo em ti,
Em teu olhar de primavera
Mas foi assim que me perdi.
.
Eram manhãs emaranhadas,
Porque em tudo parecia
Haver histórias não contadas,
Haver silêncios, poesia.
.
E porque eu agora me prestava
A ser o sentido que insinua
E que em historias se contava
Mas que a vida perpetua.
.
F.T.O

15/11/2009 (DA IDÉIA QUE FIZ DO AMANHECER)

.
Escrevo o dia em minha mente,
Em fragmentos tão dispersos
E então percebo de repente:
O mundo cabe nos meus versos.
.
Já houve tempo em que eu vivi
Sem ter alento, sede ou fome
E eu era tudo o que escrevi
No corpo vivo de meu nome.
.
Lembro manhãs sempre molhadas
Porque meu hábito de escrever
Fez que elas fossem disfarçadas
Da idéia que fiz do amanhecer
.
F.T.O

16.11.2009 (HORAS VAGAS)

.
Nas horas paradas, observo
Sem pretender explicação
Porque em mim ainda conservo
As coisas que não virão.
.
Não sei porque e nem cogito
Apenas sei que elas não vem
São como sou em meu conflito
E que sou tudo que elas tem.
.
E as horas vagas mais parecem
Que tentam mesmo confundir
O que eu sou e o que conhecem
Com o que já fui sem existir.
.
F.T.O

17/11/2009 (A FALTA DE TEMPO)

.
A falta de tempo é a redoma,
Que torna a vida inconsistente,
É um corpo vivo mas em coma,
Que sobrevive em ser ausente.
.
É um transladar de lado a lado
O lado errado do aconchego,
Que se perdeu em seu translado
E se esqueceu do desapego.
.
E no transcurso do amanhã
O tempo irá em seu revés
Tornar a vida sempre vã
E de ti fará o que não és.
.
F.T.O

18.11.2009 (ÀS VEZES CHOVE OU RELAMPEJA)

.
Às vezes chove ou relampeja
Dentro da idéia que eu fiz
De ser apenas quem almeja
Jamais ser nada, nem feliz.
.
Não ter com que se proteger
Das intempéries da má sorte
Chegar a nada e só conter
O corpo magro que comporte.
.
Comporte a vida que se esvai
E onde só baste um relampejo
E a chuva esquálida que cai
No imenso nada que almejo.
.
F.T.O

19/11/2009 (NÃO ESTOU EXATAMENTE CERTO)

.
Não estou exatamente certo
Daquilo com que pareço
Sou quase sempre um deserto,
E às vezes me desconheço.
.
Penso que eu seja a mera
Chance de vida, perdida,
Que nada têm do que espera,
Ou nada espera da vida.
.
E é deste modo, confuso,
Que meu pensamento se tolhe
Pra ser o objeto de uso
Daquilo que ele recolhe.
.
F.T.O

20/11/2009 (E EU ME VEJO COMO ALGUÉM)

.
E eu me vejo como alguém
Cujo arquétipo se aproxima
De alguma coisa que não tem
E que tão nele predomina.
.
É uma visão, é um sombreado
De uma frase onde eu li
Que tudo em mim foi infundado
E que afinal nem existi.
.
E assim eu vejo a envergadura
Do que não sou mas que irá
Cavar em mim a sepultura
Pra enterrar meu o corpo lá.
.
F.T.O

21.11.2009 (O SILÊNCIO DAS COISAS)

.
São aves que se esqueceram
Do lugar que procuravam
Foram além e se perderam
Ou simplesmente nem voaram.
.
São só aves sem paradeiro
Que debandaram no incerto
Percorreram o mundo inteiro
Sem saber que estavam perto.
.
São só aves, apenas aves,
Porém nada é ser somente
Todas as coisas são entraves
Quando voar é simplemente.
.
F.T.O

22.11.2009 (CORRESPONDÊNCIA)

.
Escrevo uma carta para mim
Não que, de fato, eu vá ler,
Mas é que uma carta escrita assim
Fala da gente sem dizer.
.
É só um relato e não agrega
Qualquer verdade apregoada
Não tem sintaxe, não tem regra
É só uma carta e mais nada.
.
Porém se me perco na cadência
Por um detalhe que omito
É por faltar-me a transparência
De escrever-me sem tê-lo dito.
.
F.T.O

.

23.11.2009 (COSMONAUTA)

.
Finjo que sou um cosmonauta
Cruzando espaços e quimeras...
Navego os céus em noite alta
No brilho intenso das esferas
.
Invento os pontos que atinjo
Nos redemoinhos do espaço
Finjo até mesmo que não finjo
Que estou em tudo o que faço

.
Mas quando atinjo a nevoenta
Manhã sem graça, já não sei,

Se o que é fingido se inventa,
Eu devo crer que me inventei.
.
F.T.O

24.11.2009 (VELHO BARCO)

.
No velho barco ainda agoniza
A onda morta, sem ação,
De uma memória que divisa
O nunca ser a embarcação.
.
Não ser é algo agonizante,
É a resultante que abarca
A dor excessiva e conflitante
Do peso alusivo de uma marca.
.
Pois todo tempo é uma cava,
A greta aberta em um charco,
Que suja sempre quando lava
Tornando tudo um velho barco.
.
F.T.O

25.11.2009 (SONOLÊNCIA)

.
...e eu converti-me nisto tudo
Que hoje apenas é lembrado
Como o final de um filme mudo
E um livro velho em mal estado.
.
Um riso quieto e maltrapilho,
De um arlequim que segue torto
No longo estreito de um trilho
E busca ali o seu conforto.
.
E nesta estranha pequenez
Da coisa vista tão de fora
Não busco nem a insensatez
Pois até ela me ignora.
.
F.T.O

26.11.2009 (DECLARAÇÃO DO ALVORECER)

.
O meu olhar roubado ao teu
não é somente um olhar
Mas um rubor que se escondeu
Entre a manhã, aurora e mar.
.
Pois as manhãs derramam óleos
Sobre a varanda de tecidos
Da cor perdida de teus olhos
Em meus olhares escondidos.
.
É natural que eu não te veja
Apenas sinta quando vens
Que és a manhã e o sol te beija
Não tenho nada, tu o tens.
.
F.T.O

27/11/2009

.
A minha vida sem estética
certamente se escondeu
Numa frase tão poética
Que não é ela e nem sou eu
.
Vejo assim que se tornara
O, em mim, desconhecido
Que a frase não mascara
Nem faz menos corrompido.
.
E se foi escrita ou se não
Vejo apenas a inconstância
De ter sempre um padrão
De tão pouca importância
.
F.T.O

28/11/2009

.
Há um toque de recolher
em cada boca fechada
Que tanta coisa a dizer
E cada palavra engasgada
.
Existe um sinal de alerta
Em cada beco, avenida
Em cada frase encoberta
Em cada esquina da vida
.
Existe um sino que toca
E cada mente que pensa
E o pensamento coloca
em cada lenço mordaça
.
F.T.O

29/11/2009

.
O tempo coloca em meus lábios
palavras que eu nunca disse
Não são sermões, nem são sábios
São confissões, é tolice.
.
São coisas que eu guardei
Para dizer-te um dia
As mais puras tolices, eu sei
Mas mesmo assim eu diria.
.
Passou-se o tempo no entanto
E eu nada ousei revelar
Pois descobri que o encanto
Vem do sentir sem falar.
.
F.T.O

30.11.2009 (INSUBORDINAÇÃO)

.
Eu vou beber a água da fonte
Que existe quando orvalha
Entre a cortina do horizonte
E a neblina que a espalha.
.
E vou beber até cansar-me
Eu seguirei na exaustão
Até quando não me alarme
Com o que todos pensarão.
.
Vou beber a água corrente
Que se extingue no regato
Até quando a experimente
Como ela o é e não de fato
.
F.T.O

01/12/2009

.
É o vento raro de outras eras
Que faz a noite ser mais calma
Tornando o canto das esferas
A voz serena de minha alma.
.
Penso em ti e sinto o peso,
O leve peso de existir
Neste pavio enfim aceso
Minha vontade em te seguir.
.
Então irei aonde estás
Atravessando caos e mágoas
Te seguirei, me seguirás
No mais profundo dessas águas.
.
F.T.O

02.12.09 (CONCERTO AO LUAR)

.
Te vi á noite entre as estrelas
Então não soube precisar
Se me perdi de então ao vê-las
Ou me esqueci por te olhar.
.
E a noite calma desatenta
Não percebeu que te esconder
Cria a razão que fundamenta
A esperança de te ver.
.
Pois há no brilho do invisível
A doce glória da conquista
Que dota ao ser mais divisível
A sensação da coisa vista.
.
F.T.O

03.12.09 (PAS DE DEUX)

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O teu silêncio é como a dança
Que meu silencio apenas sente
Num véu aberto que alcança
Este balé que há na gente.
.
Então seu corpo se levanta
E num movimento ritmado
Ordenadamente se agiganta
E se coloca do meu lado.
.
E assim igual ao instrumento
Retém o fino e raro toque
Do corpo esguio em movimento
Quando a dança o provoque
.
F.T.O

04.12.09 (PERENIDADE)

.
Teu rosto repousa transparente,
como pintura numa lousa...
Nada esconde apenas sente,
Então por isso só repousa.
.
E os olhos fitam no incerto
De uma forma que parece
Que o infinito está tão perto
E nada mais, tudo emudece.
.
Se a alguém coubesse definir
Tudo a dizer seria vão...
Nada é mais belo que sentir
O que não tem definição.
.
F.T.O

05.12.09 (SARAU)

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Eu te desenho em minha mente,
Te redecoro a cada linha,
Porque você naturalmente
Já é tão sua quanto minha.
.
Te beijo a fronte numa valsa,
E te convido pra dançar
Teu corpo leve então realça
O meu esforço em te alcançar.
.
Te redecoro em cada ponto
Só pra te ver como tu és
E pra entender que estou pronto
Pra por meu mundo a teus pés.
.
F.T.O

06.12.09 (ESQUÁLIDO)

.
Há coisas que só acontecem
Porque foram esquecidas;

Instantes que não parecem
Freqüentar as nossas vidas.
.
São detalhes que a gente
Simplesmente não os via,
Ou de os ver constantemente
Se esqueceu porque sabia.
.
Porém quando tudo passa,
Ou que enfim desaparece,
É que vemos toda a graça
De uma coisa que acontece,
.
F.T.O

07.12.09 (ESPERA)

.
O tempo agora é de dar tempo
De não sair no vendaval,
De ser somente um passatempo,
Relva perdida no quintal.
.
O tempo agora é de ser nada,
Maçã colhida no jardim,
Buraco aberto na calçada,
De ter você perdida em mim.
.
O tempo agora é uma espera
Que cola o rosto transparente
No cume alto da cratera
Deste vulcão que há na gente.
.
F.T.O

08.12.09 (BRUMAS)

.
Lembrei-me de ti esta manhã
E a brisa leve perfumada
Trazia aromas de hortelã
Com flores brancas na estrada
.
E a névoa densa e submersa
Tinha seu cheiro, seu sorriso
Um resto ainda da conversa
E uma canção que idealizo.
.
Assim me fiz esta lembrança
Porque senão a esqueceria
Na frase feita de uma dança
Que o teu silencio dançaria.
.
F.T.O

09.12.2009 (SOLAR)

.
Hoje acordei com a certeza
De que nada vive no depois
Que o mundo inteiro é correnteza
Que desemboca entre nós dóis.
.
Que as horas vivem um segredo
Que ninguém pode revelar
E a flor que vive no rochedo
É a porta aberta para o mar.
.
Hoje acordei, e sem que eu visse
Todo o meu mundo acordou
Com a certeza que eu te disse
Um pouco disto que eu sou.
.
F.T.O

10.12.2009 (CLARIDADE)

.
Hoje entendi o que não vejo
A rara e dúbia intensidade
Entre o amor e o desejo
E nenhum deles na verdade.
.
O teu silencio me rodeia
E o som diáfano do dia
É um estopim que incendeia
Tudo que a vida silencia.
.
Te digo coisas mas esqueço
De te dizer principalmente
Que estás além do que mereço:
És o caminho à minha frente.
.
F.T.O

11.12.2009 (LIBERDADE)

.
Tenho saudade a todo instante
como o orvalho tem da flor
É a dor confusa e tão constante,
A qual chamamos de amor.
.
Não sei porquê, às vezes queima
Em uma ardência consumida
Chama sutil que tanto teima
E incendeia a minha vida.
.
É uma torrente que derrama
E a tudo tenta consumir
Na sempre quieta e mesma chama
Que fê-la um dia existir.
.
F.T.O

12/12/2009

.
Eu decifrei o teu mistério
Recalculei o teu sentido
Retornarei ao teu império
Porque o tive já perdido
.
Tu es o preço claro e justo
Que mostra à minha pequenez
Que toda coisa tem um custo
Tem seus segredos e porques
.
Ajuntarei a minha carta
a tua carta de alforria
Estmos livres ante a farta
Loucura insana da alegria.
.
F.T.O

13/12/2009

.
Estás em mim o tempo todo
Teu sono é leve a quem o perturbe...
Anjos, marfim, argila e lodo
Vozes que cantam pela urbe.
.
Estas em mim como a promessa
De um passado incalculavel
E que apenas se expressa
Porque em nós é interminavel.
.
Estás, estou... sempre estamos
Num mesmo tempo e lugar
São só lugares que passamos
Para um dia nos lembrar.
.
F.T.O

14/12/2009

.
A minha ausencia se predece
Da solidão que me exila
Num sentimento que me impede
De esquecer-me ao senti-la.
.
Eu penso em ti, esta distancia
Apenas sei que determina
A mais finita inconstancia
E tudo que fazéaproxima
.
Te Sinto toda, teu perfume
Terna fragancia de absinto
E minhas horas tem ciume
Por não sentir o que eu sinto
.
F.T.O

15/12/2009

.
Se foi o dia em que eu sentia
A solidão emaranhada
A quase tudo que eu fazia
E à certeza de ser nada.
.
Os tempos voam, cada passos
parecem mesmo conspirar
Que asas surgem de meus braços
E tudo em mim querer voar
.
Mas vejo em ti meu baluarte
Tudo que vem depois da morte sorte
Pois há de i em toda parte
Seja na vida ou na morte
.
F.T.O

16/12/2009

.
Tu és em mim como o horionte
Quando o mundo perder a cor
água que escorre pela fonte
A esencia pura do sabor
.
A minha sina e a liberdade
O talismã que eu carrego
Espera incerta, a saudade
Um ponto vago, dúbio e cego.
.
A minha escrita, minha historia
não saber quem escreveu
Que somos nós esta memória
Escrita em ti e lida em mim.
.
F.T.O

17/12/2009 (VORAZ)

.
Vou encontrar teu ponto certo
vou te achar onde perdi
onde em ti fui descoberto?
onde em mim eu te esqueci?
.
Vou te buscar na densa bruma
no vendaval em movimento
Pra ver se a gente se acostuma
A não ser mais esquecimento.
.
E Vou inventar outra maneira
pra começa de onde parei
E ainda que leve a vida inteira
Vou te buscar onde deixei.
.
F.T.O

18/12/2009

.
O meu corpo chama pelo teu
Em uma porta sem saída
Que responder ao corpo meu
É tão somente dar-lhe vida.
.
É dar alento ao moribundo
É dar-lhe apenas um lugar
No palco imenso deste mundo
Onde ele vá contracenar.
.
Os corpos falam, se expressam
Se comunicam igualmente
Porém às vezes só confessam
Este furor que há na gente.
.
F.T.O

19/12/2009

.
o mar é feito dos instantes
em que podaiamos lembrar afundar
porque já fomos navegantes
voce e eu, o fundo e o mar
.
Nós dois já fomos argonautas
Em meio a mares caudalosos
Pra refletir as noites altas
em precipicios perigosos
.
Fostes meu barco, minha guia
Minha certeza e minha fé
E o furacão que desafia
A descobrir o que ele é
.
F.T.O

20/12/2009 (EQUAÇÃO)

.
Talvez a gente nem combine
E só pretenda começar
Para que um ao outro ensine
O modo certo de se amar.
.
Talvez a gente nem suporte
E só pretenda insistir
Para tornar ao outro forte
E esquecer de desistir.
.
E talvez a gente se complique
Pela mais simples equação
E cujo motivo só a explique
A voz que está no coração.
.
F.T.O

21/12/2009 (NÃO MAIS PODIA ESQUECER)

.
A rua de pedra esconde,
Em pavimentos de brisa,
Um sem porque nem aonde
E que de nada precisa.
.
São os sussurros no ar
Que do silencio me arrasta
Ao que não sei escutar
Ou que ouvi e me basta.
.
Mas de te ouvir em nós dois
É que eu fui perceber
Que em repetidos depois
Não mais podia esquecer.
 .
F.T.O

22/12/2009 (REVELAÇÃO)

.
Não estou certo de que possa
Dizer aquilo que sinto,
A intimidade nunca é nossa,
E como a água na poça
Às portas de um labirinto.
.
Que diria do que é meu
Se pouco de meu ele tem
E o que fiz, não sendo eu,
Um outro me precedeu
Fazendo o mesmo também.
.
Assim que estranho pareça
Não me posso avaliar...

Sou quem mais me desconheça
Objeto que se esqueça
Sobre a mesa de jantar.
.
F.T.O

23/12/2009 (MEU OSTRACISMO)

.
Vou aceitar meu ostraciso
E que me chamem de ninguém,
Serei somente um mecanismo,
Um velho nome de batismo,
Uma notícia que não vem.
.
Vou aceitar meu banimento
Pra não lembrarem mais de mim
Assim serei o esquecimento
A velha estátua de cimento
Envelhecida no jardim.
.
Vou aceitar as condições
Que velhos nomes impuseram
Mesmo sabendo que as razões
Apenas são opiniões
Do veredicto que ela deram.
.
F.T.O

24/12/2009 (O BRILHO DOS OLHOS DELA)

.
O brilho dos olhos dela,
Tem algo, não sei o que,
Que tanto esconde e revela,
Quando ela passa e me vê.

E o meu olhar insinua,
O que não posso pensar,
Do brilho que continua,
Mesmo depois de passar.

Como não sei abordá-la,
Quisera apenas supor,
Que este encontro sem fala,
É um começo de amor.
.
F.T.O

25/12/2009 (EU SOU METADE)

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Eu sem voce sou só metade
Metade de um algo concebido
Não sou mentira nem verdade
Sou o que sou, inconcluído.
.
Sou a distância entre o véu
O ponto crítico da borda
Que rodopia em carrossel
Porém esquece o que recorda
.
Sou a urgência do que urge
Um vendaval, um torvelinho
Um grito pasmo que ressurge
Em cada palmo do caminho.
.
F.T.O

26/12/2009 (PRA GENTE CRER QUE NÃO FOI NADA)

.
Em cada onda do mar habita
Um sentimento sem razão
Que o vão da praia regurgita
Para reter sua vazão.
.
Vou sacudir meus pavimentos
E todas ondas que habitei
Irão ruir sem movimentos
Por cada grito que calei
.
E em tudo existe esta latencia
De alguma coisa propalada
No veu calado da existencia
Pra gente crer que não foi nada.
.
F.T.O

27/12/2009 (E ASSIM SÃO OS CORAÇÕES)

.
E assim são os corações;
Tão desiguais e aparentes
Porque nas mesmas emoções
Têm reações tão diferentes
.
Em um momento desprendido,
Percebe tudo que se passa,
Porém faz coisas sem sentido
Embora crêem que não as faça.
.
E assim são, e apenas são
E isto é tudo que convence
Da gente-lo em si ou não
E não saber se nos pertence
.
F.T.O

28/12/2009 (CONFIDÊNCIA)

.
Existe em mim o que não conto
Ponto e virgulas que criei
Para fingir que estive pronto
Ou que enfim me preparei.
.
São pontos vagos ou calados
Virgulas perdidas no papel
Onde deixei mal anotados,
Fichas vendidas a granel.
.
Falar de mim é quase igual
A referir-se a coisa alguma
Não tem sentido e como tal
O nada é tudo que a resuma.
.
F.T.O

29/12/2009 (E A GENTE É MESMO DIFERENTE)

.
...e a gente é mesmo diferente
Pois em momentos desiguais,
Fazemos coisas comumente
Que outros já não fazem mais.
.
Quando percebo que me olhas
Buscando tudo em nada ver
Sinto-me um livro que desfolhas
Porque só tu o sabes ler.
.
Então daquilo que sabemos
Tão pouca coisa se contrasta
Porque nós dois apenas lemos
O livro do outro e isto basta.
.
F.T.O

30/12/2009 (AS SOMBRAS FALAM NO ESCURO)

.
As sombras falam pelo escuro
Esta é a voz que a noite tem...
Vem de um silêncio quase puro
Pois sai da boca de ninguém.
.
É uma voz confusa e rouca
Tão absurda de se ouvir
Porque o silêncio fere a boca
Quando alguém quer repetir.
.
Escuto a noite, e ela diz
Numa frequencia quase morta
Meu verso mudo e infeliz
Jamais escrito e pouco importa.
.
F.T.O

31/12/2009 (NUVENS CARREGADAS)

.
...e assim as nuvens carregadas
Vêm perturbar os meus sentidos
Me acordando às madrugadas
Em meio aos sonhos repetidos
.
E tudo o que vejo é simplesmente
Uma ranhura que aproxima
O que eu não vejo plenamente
Sinta na pele e o não exprima
.
E o inexprimível é como ter
Alguma coisa que equivale
Ao ter um nada pra dizer
Quando enfim tudo se cale.
.
F.T.O

01/01/2010 (TE PROCUREI)

.
De procurar-te e sempre e tanto
A minha vontade transformou-se
Em um silencio mudo e branco
Ou algo igual que assim o fosse.

Eu te busquei em noite escura
E pelas auroras mais tardias
Que descobri que na procura
Estava o rumo aonde ias.
.

E te busquei em meio a gestos
Em mar revolto, embarcação,
Pra descobrir em ti meus restos
E encontrar em mim razão.
.
F.T.O

02/01/2010

.
Eu me sinto às vezes tão igual
A um deserto, a um cercado,
Ou aos mourões de um curral
Que prendem a si e não ao gado.
.
Porém não sei se realmente,
Algo de gado há em nós
Apenas sei que há na gente
Um matadouro, um algoz.
.
E isto é igual a um vasilhame
Que reterá ou não se perca
Esta couraça de arame
Que transformou-nos numa cerca
.
F.T.O

03/01/2010 (A MÃO DA TARDE CINZELA)

.
E a mão da tarde cinzela
Em sua vil lucidez
A imagem que é vista por ela
Ou que por ela se fez.
.
É uma visão que se cria
Ou que apenas adorna
O que o objeto seria
E aquilo que ele se torna
.
Assim a arte se espalha
Em uma estranha estrutura
E a mão da tarde que a entalha
Faz parte da escultura.
.
F.T.O

04/01/2010 (...AOS VELHOS CANHÕES)

.
As sombras caíram no ocaso
Do dia que já passou
Num vôo tão curto e tão raso,
E que tão pouco perdurou.
.
E a nau perdida em um ponto
Singrando por alheias sagas
Viraram apenas um conto
Relido nas horas vagas.
.
Mas o meu coração inexplorado,
Alenta aos velhos canhões
Com um conto apenas contado
No encontro de corações.
.
F.T.O

05/01/2010 (HIALINO)

.
A névoa na tarde, à toa,
Tinge as casas de marfim
Só pra eu saber que nevoa
Ou apenas vê-la assim.
.
E ao vê-la não defino
O lugar pra onde vai
Nem me vejo ou imagino
Nessa nevoa quando cai.
.
E assim me faço retraído
Por sabê-la em demasia
Neste rastro esquecido
E onde antes nada havia.
.
F.T.O

06/01/2010 (LONGITUDINAL)

.
O entardecer é uma promessa
De que o dia continua
De que ele sempre recomeça
E outras vezes nem recua
.
E cada instante é uma prova
É uma sorte que nos brinda
Com a profusão que se renova
E cujo fim não veio, ainda.
.
E como a luz que se radica
Na flor do orvalho refletida
Tudo que vai apenas fica
Na eterna ausência repetida.
.
F.T.O

07/01/2010 ( E ASSIM RESSURGE...)

.
E assim ressurge a madrugada,
(Velho rabisco que mantenho
De alguma forma ordenada
N'algum esboço de desenho).
.
E assim se esvai a escuridão
Nenhum desenho a mantém
Os homens nunca a lembrarão
E ela existe pra ninguém.
.
E assim ressurge o dia claro
A vida toda é como um vicio
Como um perfume nobre e raro
Que não permite desperdício.
.
F.T.O

08/01/2010 ( AS CALÇADAS FRIAS ONDE PASSO)

.
As calçadas frias onde passo
Fazem lembrar a prateleira
Da casa velha, sem terrarço,
Onde vivi a vida inteira.
.
Água escorrendo no telhado,
E um chumaço de jornais
Num velho canto abandonado
Sobre um arranjo de corais.
.
Depois de tanto, agora sei,
A consonância de meus dias
É de jornais que não lerei
E de calçadas sempre frias.
.
F.T.O

09/01/2010

.
Todas as coisas que eu te disse
Ainda soam por interiras
Como se o tempo se incumbisse
De não torna-las verdadeiras.
.
Pois todas elas são revistas
Entre o ver e o ocultar
Entre as pegadas e as pistas
Do que eu sinto sem falar.
.
A nossa vida é uma cortina
Um candelabro na janela,
Chama que mata a parafina
Para extrair o fogo dela.
.
F.T.O

10/01/2010 (EU DESAPRENDO O QUE É SENTIR)

.
Eu desaprendo o que é sentir
E ainda não sei reaprender
Tudo o que sou é o transmitir
Daquilo que não sei dizer.
.
Cometo erros francamente
Que se um outro os conhecesse
Veria a mim completamente
Como se o erro o descrevesse.
.
E tudo que sei ou que senti,
Além das coisas repetidas,
Estão as falhas que esqueci
E ainda não foram cometidas.

.
F.T.O

11/01/2010 (POR MAIS QUE A NOITE SE AQUIETE)

Por mais que a noite se aquiete
Eu busco ao dia que agite
Ao que me falta ou complete
Ao que em mim é limite...
.
...No descompasso mais largo
Verei ao sol por se por...
Velho, azedo ou amargo
Tão decadente e sem cor.
.
Por mais que a noite me tente
Inda serei como louco
Que tenta ser ou invente
Ao nada além de ser pouco.

12/01/2010 (ALGUMA ESTRELA)

ALGUMA ESTRELA
.
E sei, alguma estrela se esconde,
No fundo falso do que sou
E ela é tão igual ou coresponde
Ao que em mim jamais mudou.
.
É o lado oposto, é o contraponto
Da pedra nunca cinzelada
É o meio termo do confronto
Entre ser algo em sendo nada.
.
E nesta estrela se reflete
Como na vidraça umedecida
A velha imagem que repete
Que se perdeu em minha vida.
..
F.T.Oliveira

13/01/2010 (A CHUVA CAINDO NO LAGO)

.A chuva caindo no lago
Diz, de modo diferente,
Que ondas, em mim, as trago
Por não tê-las realmente.
.
Ele me fere com a adaga
Em cortina transformada
De indiferente e vaga
Grafada sobre o meu nome.
.
E embora eu pouco o diga
Essa dor me leva a crer
Que enfim é a mão amiga
Que me ensina em meu doer.

14/01/2010 (IMPONDERÁVEL)

I
.
Quem sou eu? - Somente sabe
Ou simplesmente imagina
Que minha alma já não não cabe
Nesta janela da retina.
.
Quem somos nós? Assim define
O instante vindo logo após
De quando alguém se imagine
"Não somos um, nós somos nós".
.
Aonde irei? Não sei se posso
Falar de algo visto em mim
Seja o que seja - qualquer troço
Disto que fui ao "ser assim"
.
II
.
De longe, na praia deserta,

Cuja areia é branca e fria,
Vive a ilha recoberta
De tormentos e magia.
.
E na distância, adormecida,
Nos silêncios cambaleia
A maré mais esquecida
Em seus sonhos de areia.
.
Mas o mar distante vê
Neste mundo em desalento
Que os mundos que ele crê
São tragados pelo vento.

15/01/2010 (A ESTRADA ESCONDE)

A estrada esconde fora
O caminho que vai dentro
Confundindo a quem explora
E afastá-lo de seu centro.
.
E o seguir-se se traduz
Em não crer que tanto faz
Que um rumo se conduz
Ao porvir do "algo mais"
.
E assim morre na estrada
Tudo quanto se empregue
Por não vê-la abandonada,
Por fiar-se em quem a segue.

16/01/2010 (O OLHO D'ÁGUA)

O olho d´água reflete
A cara magra da lua
Ou somente se repete
A imagem que é sua.
.
Que tão vaga distancia
Do que não se reconhece
Pois reflete a nostalgia
Sem saber com que parece.
.
"Tudo que mata conforta"
E a imagem, sendo mágoas,
Desconhece que é morta
Na dor profunda das águas.

17/01/2010 (FINA CAMADA)

A fina camada de veludo
De meus sentidos se constrói
Do pouco que sou e de tudo
Que sinto em mim e que dói.
.
E é neste torpe sentimento
Ininterrupto e frequente
Que eu mim experimento
O sentido de estar ausente.
.
E embora me pese encanto
D que em mim se comprova
A dor me dói e dói tanto
Que sempre parece ser nova.

19/01/2010 (NÃO É SÓ...)

Não é só uma lágrima, é mais
É mais que isso, e é somente,
A simples dor que os mortais
Todos a sentem , igualmente..
.
Não é só a dor (ou pelo menos),
No limiar de uma etapa,
Nos sentimentos mais pequenos,
Toda essa dor se nos escapa
.
Não é só isso. e nem é só
Uma tristeza que nos sai
E que nos faz ter muita dó
Da estranha lágrima que cai.

(DEDUÇÃO) 20/01/2010

..Por entre as curvas, uma curva
Um céu de estrada, desalentos
A imagem minha clara- turva
Estrada é chão de sentimentos.
.
A mim me chamam pelo nome
Um nome estranho para mim
Uma angústia que tem fome
Um bastião, outo e marfim.
.
Que vou dizer-te, minha cara,
Se a palavra não traduz
O quanto é vaga a coisa rara
E que o outro em n´s deduz.

(O DOCE AMARGO DE VIVER) 21/01/2010

.Meu rosto cala o sofrimento
E o sentimento de perder
Na estrada afora de um momento
O DOCE AMARGO DE VIVER.
.
A vida flui, reflui, Não passa
Do ponto mórbido que agarro
Feito as cortinas de fumaça
Que se espalham de um cigarro.
.
Eu sou assim como este fumo
Uma metade estranha, louca,
A qual me entrego e  acostumo
Como a fumaça em minha boca

(HABITUAL) 22/01/2010

.HABITUAL
.
Um rosto. Silêncio! Um rosto
Na pálida luz de uma lua
Denota a dor e o desgosto
Em uma dor que não é sua.
.
Contrai-se e, alguma alusão,
Do que dissimula ou reflete
Transforma as coisas que são
Em outas que nele repete.
.
Contrai-se a humana criatura
Como se o mundo ali cavasse
A sua própria sepultura
Na dor contida em sua face.

(SOU EU O PÓ) 23/01/2010

.SOU EU O PÓ
.
Sou eu o pó que o vento leva
Da umidade que ainda vive
Tão ancestral e tão longeva
No antepassado que não tive.
.
Toda tristeza vem-me aos olhos
Quando o passado os retrai
Como sargaços e abrolhos,
Em uma lagrima que cai.
.
Eu sou o pó e quem me olha
Por nada ver se entretém
Não vê a lagrima que molha
Nem vê aquela que não vem
.
II
.
Eu não conheço a atitude
Apenas sei que inexiste
E enquanto eu jamais a mude
Ele está no que consiste
.
Não é a lágrima que rola
Não é o modo de se vê-la
Mas a intenção que se izola
Ao ver um céu em cada estrela
.
É impossivel não mudar
Não ser passado nem presente
Sair de cena, não voltar,
Estar em cada coisa ausente.
.
II
.
Sou eu o pó, uma poeira
Que a mão do vento subtrai
Minha metade quase inteira
Na noite íngreme que cai.
.
Direi a quem não me conhece
Que nunca fui reconhecido
Sou como a coisa que se esquece
Por não conter nenhum sentido.
.
Sou eu os cantos da estrada
Cantos que todos pisarão
E levarão na caminhada
Toda a lembrança do que são.
 
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